Arquivo do mês: março 2015

Falta de audiência de conciliação não impede homologação de divórcio consensual, decide STJ.

A audiência de conciliação ou ratificação que antecede a homologação de divórcio consensual tem cunho meramente formal, e a falta de sua realização não justifica a anulação do divórcio quando não há prejuízo para as partes.

Essa foi a tese adotada pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao negar, por unanimidade de votos, recurso pelo qual o Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) pretendia anular a homologação de um divórcio ao argumento de que a audiência de conciliação não fora realizada.

O recurso refere-se a ação de divórcio consensual ajuizada em 2012, tendo sido comprovado que o casal já estava separado de fato desde 2001. A partilha, os alimentos e as visitas ao filho menor, então com 14 anos, foram estabelecidos de comum acordo.
Por não haver pauta próxima para realização da audiência e por não verificar no acordo qualquer prejuízo às partes, especialmente ao filho menor, a magistrada considerou possível a imediata homologação do divórcio.

A decisão foi confirmada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS). A corte estadual entendeu que a falta da audiência de conciliação poderia configurar, no máximo, mera irregularidade que não justificaria a anulação do processo devido à ausência de prejuízo.

O Ministério Público estadual recorreu ao STJ insistindo na obrigatoriedade da audiência, mesmo no divórcio consensual, com base no artigo 40, parágrafo 2º, da Lei 6.515/77 (Lei do Divórcio) e no artigo 1.122, parágrafos 1º e 2º, do Código de Processo Civil (CPC). O parecer do Ministério Público Federal foi pelo não provimento do recurso.

PEC do Divórcio

O relator, ministro Moura Ribeiro, apontou as diversas mudanças legislativas sobre o divórcio desde a lei de 1977 e destacou que a Emenda Constitucional 66/10, que ficou conhecida como PEC do Divórcio, deu nova redação ao artigo 226, parágrafo 6º, da Constituição Federal (CF). O novo texto estabelece que “o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio”.

A alteração legislativa, segundo o ministro, simplificou o divórcio e eliminou os prazos para sua concessão, colocando em prática o princípio da intervenção mínima do estado no direito de família. “Cria-se nova figura totalmente dissociada do divórcio anterior”, afirmou Moura Ribeiro.

Com isso, o relator entendeu que as normas invocadas pelo MPRS passaram a ter redação conflitante com o novo ordenamento ao exigir a realização de uma audiência para conceder o divórcio direto consensual. Isso porque não existem mais as antigas condições de averiguação de motivos e transcurso de tempo da separação de fato.

Nova interpretação

O MPRS alegou no recurso que a EC 66 não revogou as disposições infraconstitucionais a respeito do divórcio consensual. O ministro Moura Ribeiro reconheceu que a Lei do Divórcio ainda permanece em vigor. Contudo, afirmou que a intenção do legislador foi simplificar a ruptura do vínculo matrimonial.

“Trata-se, em verdade, de nova interpretação sistemática em que não podem prevalecer normas infraconstitucionais do Código Civil ou de outro diploma, que regulamentavam algo previsto de modo expresso na Constituição e que esta excluiu posteriormente, como no presente caso”, explicou o relator no voto.

O ministro assegurou que essa nova interpretação não viola o princípio da reserva de plenário, previsto no artigo 97 da CF, segundo o qual “somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público”.

Segundo o relator, a decisão não faz qualquer declaração de inconstitucionalidade, mas somente a interpretação sistemática dos dispositivos legais relacionados ao caso em julgamento.

REsp 1.483.841- RS

FONTE STJ

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Arquivado em Direito de Família 2015, Processo Civil 2015

Boa-fé é requisito para o adquirente demandar pela evicção, entende STJ.

“Reconhecida a má-fé do arrematante no momento da aquisição do imóvel, não pode ele, sob o argumento de ocorrência de evicção, propor a ação de indenização com base no artigo 70, I, do Código de Processo Civil (CPC) para reaver do alienante os valores gastos com a aquisição do bem.”

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) isentou o Banco do Brasil da obrigação de indenizar os arrematantes de um imóvel, que propuseram a ação indenizatória alegando a ocorrência de evicção.

O imóvel havia sido hipotecado ao banco pelo pai. Levado a leilão, foi arrematado pelos filhos, quando ainda estava pendente de julgamento um mandado de segurança impetrado pelo pai para retomar a propriedade. Após decisão favorável da Justiça no mandado de segurança, os filhos entraram com a ação indenizatória pretendendo ter de volta os valores pagos no leilão.

A Justiça de Goiás determinou que o dinheiro fosse devolvido.

Indispensável

No STJ, a decisão foi reformada. De acordo com o relator do recurso, ministro João Otávio de Noronha, a boa-fé do adquirente é requisito indispensável para a configuração da evicção e a consequente extensão de seus efeitos.

O ministro citou o artigo 457 do Código Civil, segundo o qual “não pode o adquirente demandar pela evicção, se sabia que a coisa era alheia ou litigiosa”. No caso, o Tribunal de Justiça de Goiás reconheceu que os adquirentes tinham ciência de que o imóvel havia sido dado em hipoteca por seu pai e foi levado a leilão quando havia um processo judicial pendente.

A partir desses fatos, a Turma entendeu que não houve boa-fé no momento da aquisição do bem, o que afasta o direito à restituição dos valores com base na evicção.

REsp 1.293.147-GO

FONTE STJ

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Arquivado em Direito Imobiliário, Teoria Geral dos Contratos 2015

STJ: Concubina sustentada por mais de 40 anos faz jus a alimentos.

Mesmo na relação de concubinato, faz jus a alimentos a mulher que, por mais de 40 anos, foi sustentada pelo homem, tendo abdicado de sua profissão em razão do relacionamento.

O entendimento, proferido pelo TJ/RS, foi tomado como base pela 3ª turma do STJ para negar provimento a recurso que buscava impedir a percepção do sustento por parte de concubina com mais de 70 anos, em razão do fim da convivência.

O colegiado ponderou que a obrigação deveria ser mantida, sob pena de causar desamparo à idosa, “mormente quando o longo decurso do tempo afasta qualquer risco de desestruturação familiar para o prestador de alimentos”.

“Que dano ou prejuízo uma relação extraconjugal desfeita depois de mais de quarenta anos pode acarretar à família do recorrente? Que família, a esta altura, tem-se a preservar?”, questionou o relator do acórdão, ministro João Otávio de Noronha.

Relacionamento amoroso

No caso, as partes mantiveram um relacionamento paralelo ao casamento do réu por cerca de quatro décadas. A mulher abandonou sua atividade profissional em 1961, passando a viver às expensas do homem que, inclusive, assinou sua CTPS para fins previdenciários. Após este longo tempo de convivência, entretanto, a relação foi desfeita.

Ela, então, ajuizou ação de reconhecimento e dissolução de união concubinária com pedido de partilha de bens e alimentos e/ou indenização por serviços prestados. O juízo de 1º grau julgou o pleito parcialmente procedente, condenando o réu a pagar alimentos no valor equivalente a 2,5 salários mínimos mensais.

Ambas as partes recorreram e o TJ/RS deu parcial provimento ao recurso da autora e desproveu o recurso do réu, afastando a alegação de inexistência da dependência econômica por considerar que ela não podia, aos 73 anos de idade, ficar totalmente desamparada.

“Se o réu optou por sustentá-la, desde quando ainda era jovem, bonita e saudável, muito mais o deve agora, quando surgem os problemas de saúde em decorrência da idade avançada, sendo impossível o ingresso no mercado de trabalho”.

Dignidade e solidariedade humanas

No STJ, o recorrente alegou que houve contrariedade aos arts. 1.694 e 1.695 do CC, visto que os referidos dispositivos só fazem menção ao direito alimentar entre parentes, cônjuges ou companheiros, não dispondo sobre eventual dever de prestar alimentos a concubinas.

Em seu voto, o ministro relator destacou que o direito alimentar é muito mais amplo do que se supôs, exigindo cautela por parte do julgador, que deve encontrar o ponto exato de equilíbrio seja para fixar, seja para afastar o dever de alimentar ou o de prover o sustento de determinada pessoa.

Nesta esteira, a regra contida nos dispositivos citados, segundo Noronha, foi estabelecida com o escopo de dar máxima efetividade ao princípio da preservação da família. Ocorre que, frente às peculiaridades, que tornam o caso excepcionalíssimo, o ministro verificou a inexistência de risco à desestruturação da família do recorrente.

“Ficou evidenciada, com o decurso do tempo, a inexistência de risco à desestruturação da família do recorrente, bem como a possibilidade de exposição de pessoa já idosa a desamparo financeiro, tendo em vista que foi o próprio recorrente quem proveu o sustento, o que vale dizer, foi ele quem deu ensejo a essa situação e não pode, agora, beneficiar-se dos próprios atos.”

Processo relacionado: REsp 1.185.337/RS

Fonte: STJ

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Condomínio não consegue impedir uso do subsolo em profundidade que não lhe é útil, decide STJ.

O proprietário do imóvel não tem interesse legítimo para impedir a utilização do subsolo onde foram colocados tirantes de concreto destinados à sustentação de obra vizinha se esse espaço não tem nenhuma utilidade para ele.

A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar recurso em que se alegou esbulho com a invasão do subsolo por pinos de concreto de mais de dez metros de comprimento, utilizados para sustentação da obra de um mercado.

O Condomínio Edifício Terrazza del Sole, em São Paulo, propôs ação de reintegração de posse cumulada com demolição e perdas e danos contra o Hipermercado Big. A alegação é que houve invasão de propriedade, pois os tirantes impediriam o condomínio de ampliar a área de garagem ou a profundidade da piscina.

O artigo 1.229 do Código Civil dispõe que “a propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo correspondentes, em altura e profundidade úteis ao seu exercício”. Segundo o relator, ministro João Otávio de Noronha, “não pode o proprietário opor-se a atividades que sejam realizadas por terceiros a uma altura ou profundidade tais que não tenha ele interesse legítimo em impedi-las”.

Utilidade

De acordo com o ministro, o artigo 1.229, ao regular o direito de propriedade, ampara-se especificamente no critério de utilidade da coisa por seu titular.

A perícia, no caso, constatou que a invasão do subsolo realmente ocorreu, mas sem danos físicos à construção do condomínio. A questão técnico-jurídica era saber se a invasão constituía esbulho, seja em decorrência da sua localização e profundidade, seja diante da ausência de restrição de gozo e fruição da propriedade pelo condomínio.

Noronha ressaltou que a titularidade do proprietário em relação ao imóvel não é plena, estando satisfeita e completa apenas no espaço físico onde é efetivamente exercido o direito sobre a coisa.

O relator observou ainda que o condomínio não comprovou nos autos eventual utilidade do espaço subterrâneo ocupado pelos tirantes nem o incômodo que esses alicerces poderiam lhe causar em futura reforma da piscina ou ampliação da garagem.

Vejam ementa:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. TIRANTES. LOCALIZAÇÃO NO SUBSOLO. IMPOSSIBILIDADE DE REMOÇÃO. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO OU DEMONSTRAÇÃO DE UTILIDADE. 1. O art. 1.229 do Código Civil, ao regular o direito de propriedade, ampara-se especificamente no critério de utilidade da coisa por seu titular. 2. A titularidade do proprietário sobre o imóvel não é plena, estando satisfeita e completa apenas em relação ao espaço físico sobre o qual emprega efetivo exercício sobre a coisa. 3. Não tem o proprietário do imóvel o legítimo interesse em impedir a utilização do subsolo onde estão localizados os tirantes que se pretende remover, pois sobre referido espaço não exerce ou demonstra quaisquer utilidades. 4. Recurso especial provido para se restabelecer a sentença de primeiro grau. (REsp nº 1.256.825 – SP, Relator Min. João Otávio de Noronha, Terceira turma, j. 05/03/2015, DJe 16/03/2015)

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Arquivado em Direito das Coisas 2015, Direito Imobiliário

Direito real de habitação da companheira é pacífico no STJ.

Direito das sucessões e das coisas. Recurso especial. Sucessão. Vigência do código civil de 2002. Companheira sobrevivente. Manutenção de posse. Possibilidade de arguição do direito real de habitação. Art. 1.831 do Código Civil de 2002. 1. É entendimento pacífico no âmbito do STJ que a companheira supérstite tem direito real de habitação sobre o imóvel de propriedade do falecido onde residia o casal, mesmo na vigência do atual Código Civil. Precedentes. 2. É possível a arguição do direito real de habitação para fins exclusivamente possessórios, independentemente de seu reconhecimento anterior em ação própria declaratória de união estável. 3. No caso, a sentença apenas veio a declarar a união estável na motivação do decisório, de forma incidental, sem repercussão na parte dispositiva e, por conseguinte, sem alcançar a coisa julgada (CPC, art. 469), mantendo aberta eventual discussão no tocante ao reconhecimento da união estável e seus efeitos decorrentes. 4. Ademais, levando-se em conta a posse, considerada por si mesma, enquanto mero exercício fático dos poderes inerentes ao domínio, há de ser mantida a recorrida no imóvel, até porque é ela quem vem conferindo à posse a sua função social. 5. Recurso especial desprovido. (STJ – Resp nº 1203144, Relator Ministro Luis Felipe Salomão, T4, J. 27/05/2014).

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Arquivado em Direito das Sucessões 2015

STJ muda posição quanto a correta interpretação do art. 1.700 do Código Civil.

STJ muda posição quanto a correta interpretação do art. 1.700 do Código Civil.

Disse em seu voto a Ministra Nancy Andrighi:

“Assim, admite-se a transmissão, apenas e tão somente quando o alimentado também seja herdeiro, e ainda assim enquanto perdurar o inventário, já se tratando aqui de uma excepcionalidade, porquanto extinta a obrigação alimentar desde o óbito. A partir de então – no caso de herdeiros – ou a partir do óbito do alimentante – para aqueles que não o sejam –, fica extinto o direito de perceber alimentos com base no art. 1.694 do CC-02, ressaltando-se que os valores não pagos pelo alimentante, podem ser cobrados do espólio. ”

Vejam como ficou a ementa:

Civil. Ação ordinária. Reconhecimento e dissolução de união estável. Celebração de acordo com fixação de alimentos em favor da ex-companheira. Homologação. Posterior falecimento do alimentante. Extinção da obrigação personalíssima de prestar alimentos. Impossibilidade de transmissão ao espólio. (STJ – REsp nº 1.354.693-SP, Relator originário Min. Maria Isabel Gallotti, voto vencedor Min. Nancy Andrighi, Rel. para acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 26/11/2014, DJe 20/2/2015).

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Arquivado em Direito de Família 2015

Mais um interessante julgado do STJ sobre parentalidade socioafetiva.

Recurso especial. Ação negatória de paternidade. 1. Prefacial. Princípios da concentração da defesa na contestação e da adstrição. Violação. Não ocorrência. Emenda da inicial, aquiescida pela parte Requerida, com reiteração das matérias de defesas desenvolvidas no Curso do processo. 2. Mérito. Declarante, sob a presunção pater is est, induzido a erro. Verificação. Relação de afeto estabelecida entre pai e filho registrais calcada no vício de consentimento originário. Rompimento definitivo. Filiação socioafetiva. Não configuração. 3. Recurso especial provido. 1. Afigura-se absolutamente estéril a discussão afeta à observância ou não dos princípios da eventualidade e da adstrição, notadamente porque a tese de paternidade socioafetiva, não trazida inicialmente na contestação, mas somente após o exame de DNA, conjugada com a também inédita alegação de que o demandante detinha conhecimento de que não era o pai biológico quando do registro, restou, de certo modo, convalidada no feito. Isso porque o autor da ação pleiteou a emenda da inicial, para o fim de explicitar o pedido de retificação do registro de nascimento do menor, proceder aquiescido pela parte requerida, que, posteriormente, ratificou os termos de sua defesa como um todo desenvolvida no processo. 2. A controvérsia instaurada no presente recurso especial centra-se em saber se a paternidade registral, em desacordo com a verdade biológica, efetuada e declarada por indivíduo que, na fluência da união estável estabelecida com a genitora da criança, acredita, verdadeiramente, ser o pai biológico desta (incidindo, portanto, em erro), daí estabelecendo vínculo de afetividade durante os primeiros cinco/seis anos de vida do infante, pode ou não ser desconstituída. 2.1. Ao declarante, por ocasião do registro, não se impõe a prova de que é o genitor da criança a ser registrada. O assento de nascimento traz, em si, esta presunção, que somente pode vir a ser ilidida pelo declarante caso este demonstre ter incorrido, seriamente, em vício de consentimento, circunstância, como assinalado, verificada no caso dos autos. Constata-se, por conseguinte, que a simples ausência de convergência entre a paternidade declarada no assento de nascimento e a paternidade biológica, por si, não autoriza a invalidação do registro. Ao marido/companheiro incumbe alegar e comprovar a ocorrência de erro ou falsidade, nos termos dos arts. 1.601 c.c 1.604 do Código Civil. Diversa, entretanto, é a hipótese em que o indivíduo, ciente de que não é o genitor da criança, voluntária e expressamente declara o ser perante o Oficial de Registro das Pessoas Naturais (“adoção à brasileira”), estabelecendo com esta, a partir daí, vínculo da afetividade paterno-filial. A consolidação de tal situação (em que pese antijurídica e, inclusive, tipificada no art. 242, CP), em atenção ao melhor e prioritário interesse da criança, não pode ser modificada pelo pai registral e socioafetivo, afigurando-se irrelevante, nesse caso, a verdade biológica. Jurisprudência consolidada do STJ. 2.2. A filiação socioativa, da qual a denominada adoção à brasileira consubstancia espécie, detém integral respaldo do ordenamento jurídico nacional, a considerar a incumbência constitucional atribuída ao Estado de proteger toda e qualquer forma de entidade familiar, independentemente de sua origem (art. 227, CF). 2.3. O estabelecimento da filiação socioafetiva perpassa, necessariamente, pela vontade e,mesmo, pela voluntariedade do apontado pai, ao despender afeto, de ser reconhecido como tal. É dizer: as manifestações de afeto e carinho por parte de pessoa próxima à criança somente terão o condão de convolarem-se numa relação de filiação, se, além da caracterização do estado de posse de filho, houver, por parte daquele que despende o afeto, a clara e inequívoca intenção de ser concebido juridicamente como pai ou mãe daquela criança. Portanto, a higidez da vontade e da voluntariedade de ser reconhecido juridicamente como pai, daquele que despende afeto e carinho a outrem, consubstancia pressuposto à configuração de toda e qualquer filiação socioafetiva. Não se concebe, pois, a conformação desta espécie de filiação, quando o apontado pai incorre em qualquer dos vícios de consentimento. Na hipótese dos autos, a incontroversa relação de afeto estabelecida entre pai e filho registrais (durante os primeiros cinco/seis anos de vida do infante), calcada no vício de consentimento originário, afigurou-se completamente rompida diante da ciência da verdade dos fatos pelo pai registral, há mais de oito anos. E, também em virtude da realidade dos fatos, que passaram a ser de conhecimento do pai registral, o restabelecimento do aludido vínculo, desde então, nos termos deduzidos, mostrou-se absolutamente impossível. 2.4. Sem proceder a qualquer consideração de ordem moral, não se pode obrigar o pai registral, induzido a erro substancial, a manter uma relação de afeto, igualmente calcada no vício de consentimento originário, impondo-lhe os deveres daí advindos, sem que, voluntária e conscientemente, o queira. Como assinalado, a filiação sociafetiva pressupõe a vontade e a voluntariedade do apontado pai de ser assim reconhecido juridicamente, circunstância, inequivocamente, ausente na hipótese dos autos. Registre-se, porque relevante: Encontrar-se-ia, inegavelmente, consolidada a filiação socioafetiva, se o demandante, mesmo após ter obtido ciência da verdade dos fatos, ou seja, de que não é pai biológico do requerido, mantivesse com este, voluntariamente, o vínculo de afetividade, sem o vício que o inquinava. 2.5. Cabe ao marido (ou ao companheiro), e somente a ele, fundado em erro, contestar a paternidade de criança supostamente oriunda da relação estabelecida com a genitora desta, de modo a romper a relação paterno-filial então conformada, deixando-se assente, contudo, a possibilidade de o vínculo de afetividade vir a se sobrepor ao vício, caso, após o pleno conhecimento da verdade dos fatos, seja esta a vontade do consorte/companheiro (hipótese, é certo, que não comportaria posterior alteração). 3. Recurso Especial provido, para julgar procedente a ação negatória de paternidade. (STJ – REsp 709.608-MS, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Quarta Turma, DJe 23/11/2009; e REsp 1.383.408-RS, Terceira Turma, DJe 30/5/2014). REsp 1.330.404-RS, , julgado em 5/2/2015, DJe 19/2/2015).

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Arquivado em Multiparentalidade 2015, Socioafetividade e multiparentalidade

Bem de família oferecido em garantia pelo devedor pode ser objeto de penhora, decide STJ.

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) permitiu a penhora de bem de família que foi oferecido pelo devedor como garantia em renegociação da dívida. Os ministros entenderam que o devedor agiu de má-fé na execução do contrato que livremente pactuou, de forma que o caso deve ser tratado como exceção frente à jurisprudência consolidada no tribunal.

O recurso julgado diz respeito a ação de execução de título extrajudicial com base em cédula rural pignoratícia emitida pelo marido e avalizada pela esposa em favor do banco.

A cédula de crédito rural é promessa de pagamento em dinheiro, com ou sem garantia real cedularmente constituída, cujas modalidades estão previstas no artigo 9º do Decreto-Lei 167/67 – cédula rural pignoratícia, cédula rural hipotecária, cédula rural pignoratícia e hipotecária e nota de crédito rural.

Acordo

Anteriormente, houve um processo de execução no curso do qual os devedores propuseram o pagamento da dívida em valor inferior ao cobrado e concordaram em colocar como garantia o imóvel em que residiam. Descumprido o acordo, o credor requereu a avaliação do bem para penhora, ocasião em que os devedores invocaram a proteção do bem de família.

Os devedores interpuseram recurso no STJ com o argumento de que a penhora do bem ofenderia os artigos 1º e 3º, inciso V, da Lei 8.009/90. O artigo 1º impede a penhora por dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam proprietários do imóvel e nele residam, salvo as hipóteses previstas na lei.

O inciso V do parágrafo 3º, por sua vez, assinala que a impenhorabilidade é oponível em processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, exceto, entre outros, se movido para a execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar.

Princípio da boa-fé

Ao analisar o caso, a Terceira Turma do STJ concluiu que os devedores renunciaram à impenhorabilidade do bem no momento em que assinaram a petição do acordo. Segundo o relator na Turma, ministro João Otávio de Noronha, a jurisprudência do STJ considera que os imóveis que servem de residência constituem bem de família e são, por isso, impenhoráveis, mesmo quando feita a constrição por indicação dos próprios devedores. No entanto, o caso apresenta peculiaridades.

O ministro observou que a dívida foi constituída presumivelmente em benefício da família. Depois, foi celebrado acordo, homologado pelo juízo da execução, no qual as partes transacionaram quanto ao valor da dívida. “O devedor adota comportamento contraditório, em um momento indicando bem à penhora e, em instante seguinte, arguindo sua impenhorabilidade”, afirmou.

A Turma concluiu que o credor somente se interessou pelo acordo em razão da possibilidade de agregar nova garantia à dívida. Não se pode permitir, segundo Noronha, em razão da boa-fé, a desconstituição da penhora, sob pena de desprestígio do Poder Judiciário.

REsp 1.461.301

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Arquivado em Direito das Coisas 2015, Direito Imobiliário

Justiça paulista anula cláusulas restritivas em imóvel incluído em testamento.

Decisão da 2ª Vara da Família e das Sucessões de Jacareí julgou procedente pedido que trata da retirada de cláusulas restritivas em imóvel, instituídas por testamento em favor de herdeira quando era menor.

A autora da ação alegou que necessitava da retirada dos itens relativos à incomunicabilidade, inalienabilidade, impenhorabilidade e impermutabilidade, porque estariam lhe causando prejuízos atualmente.

“Passados mais de 40 anos e não podendo a autora do testamento retirar a restrição imposta, pode e deve o Judiciário fazê-lo, para que o bem gravado tenha sua livre circulação, evitando-se que se subordine o interesse social da propriedade ao interesse particular do testador – este que, embora justo na origem, atualmente não mais encontra sentido”, afirmou o juiz Fernando Henrique Pinto.

Cabe recurso da sentença.

Processo nº 1008488-36.2014.8.26.0292

FONTE AASP

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Arquivado em Direito das Sucessões 2015

Filho abandonado poderá trocar sobrenome do pai pelo da avó que o criou, decide STJ.

Com base no entendimento de que o princípio da imutabilidade do nome não é absoluto no sistema jurídico brasileiro, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou a supressão do patronímico (sobrenome derivado do nome do pai ou de um antecessor paterno) e o acréscimo do sobrenome da avó materna ao nome de um rapaz que, abandonado pelo pai desde a infância, foi criado pela mãe e pela avó.

O rapaz recorreu ao STJ contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que acolheu o pedido de inclusão do sobrenome da avó em seu nome civil, mas manteve os patronímicos paternos com base nos princípios da imutabilidade do nome e da indisponibilidade do sistema registral. Para o tribunal paulista, a mudança descaracterizaria o nome da família.

No recurso julgado pela Terceira Turma, o rapaz sustentou que a decisão violou o artigo 56 da Lei 6.015/73, já que estariam presentes todos os requisitos legais exigidos para a alteração do nome no primeiro ano após ele ter atingido a maioridade civil. Argumentou, ainda, que não pediu a modificação da sua paternidade no registro de nascimento, mas somente a exclusão do sobrenome do genitor, com quem não desenvolveu nenhum vínculo afetivo.

Posição flexível

Citando vários precedentes, o ministro relator, Paulo de Tarso Sanseverino, ressaltou que o STJ tem sido mais flexível em relação à imutabilidade do nome civil em razão do próprio papel que o nome desempenha na formação e consolidação da personalidade.

Para o relator, considerando que o nome é elemento da personalidade, identificador e individualizador da pessoa na sociedade e no âmbito familiar, a pretensão do recorrente está perfeitamente justificada nos autos, pois, abandonado pelo pai desde criança, foi criado exclusivamente pela mãe e pela avó materna.

“Ademais, o direito da pessoa de portar um nome que não lhe remeta às angústias decorrentes do abandono paterno e, especialmente, corresponda à sua realidade familiar, parece sobrepor-se ao interesse público de imutabilidade do nome, já excepcionado pela própria Lei de Registros Públicos” – ressaltou o ministro em seu voto.

Ao acolher o pedido de retificação, Sanseverino enfatizou que a supressão do sobrenome paterno não altera a filiação, já que o nome do pai permanecerá na certidão de nascimento. A decisão foi unânime.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

FONTE AASP em 18.03.2015

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Arquivado em Parte Geral 2015